quarta-feira, 27 de maio de 2015

Do São João a Miami só é preciso coragem!

Do São João a Miami só é preciso coragem!
Quando pequena eu tomava leite de cabra.
Meu pai acostumado as delicias nordestinas nos ensinou desde cedo que leite de cabra era mais gostoso e mais forte .
Pra garantir minha robustez ele carregava uma cabra amarrada na carroceria do caminhão e em qualquer lugar, Bida, esse era o nome dela, tinha leite fresco e quente pra me alimentar...
Depois quando comecei a estudar ela também se acomodou na nossa casa, que tinha um quintal que ia de uma rua a outra, com pés de manga, figo, goiaba, urucun e uma horta que só tinha couve, toda tarde meus irmãos levava a cabra pra pastar, enquanto eu tentava pegar girinos, num córrego sujo que tinha na beira da linha férrea, pra ver se viravam sapos.
Parei de viajar com meu pai por volta dos sete anos, pra estudar, pois ninguém entrava na escola antes disso e você passava esse tempo solto na vida, só por conta de brincar e sonhar.
Meu pai tinha um caminhão que era pau – de- arara, a estrada era nossa casa, no caminhão além da lona que cobria e os bancos de madeiras onde as pessoas se sentavam, não podia faltar um fogão e tudo que uma cozinha precisava.
Rapadura, farinha, feijão carne de sol, banha de porco e vontade de minha mãe fazer comida em qualquer parada, muitas vezes fomos à Brasília levar trabalhadores pra serem contratados pra trabalhar naquela que hoje é a capital do país. A primeira vez que fui, o moço que contratava os trabalhadores, por não ter lugar no alojamento, nos levou pra um hotel que também estava tendo uma reforma feita por ele e ali pela primeira vez, tive contato com as beneficias de quem tem dinheiro .
A noite minha mãe ligava e pedia o jantar, chegava o garçom com uma sopa que antecedia o jantar, eu e meu irmão, nos fartávamos de comer, de chegar a ter congestão de tanta barriga cheia, pois o gosto era bem diferente das gororoba feita nas estradas e alem da comida boa, conheci e aprendi a telefonar ali, toda hora eu tinha alguma coisa pra falar na recepção....
Passar por São Paulo era doer o pescoço de tanta curiosidade, vendo aquele amontoado de gente e aqueles prédios que nem eu nem meus irmãos tínhamos coragem de subir, minha irma nasceu lá.
No Rio de Janeiro, o mar com aquela onda que corria atrás da gente, me faz ter medo dele até hoje, pois meu pai, com os parentes de minha mãe que lá moravam, só diziam que a onda levava, que a maré derrubava e eu que nunca que ia arriscar, lá também nasceu uma irmã e outros em vários lugares...
Viajar por dias e dias não era das melhores coisas a fazer, mas só percebi isso depois, quando fincamos os pés em Valadares.
Lá andar de bicicleta, ouvir falar da América e estudar fez uma grande diferença na minha vida, ir a programas de auditório, foi um passo pra começar a cantar na radio Educadora e Por um Mundo Melhor que quase me fez ser cantora.
No Natal ganhava bonecas da Estrela, bicicleta, até um acordeon ganhei um dia, tinha muita diversão e liberdade, muitas alegrias com carnavais no Ilusão, desfiles com carros alegóricos que enchiam os olhos e o coração de orgulho e mais ainda, quando minha irmã foi destaque.
Mas mudar de mala e cuia pra Itaobim de um dia pro outro, me fez parar de sonhar e viver uma realidade que só depois de estar bem longe me fez ter alguma saudade.
Sentia falta de muita coisa, me tiraram a boa escola, os amigos, televisão, música, livros e festas, mas logo me adaptei a falta de tudo e comecei a brincar de boi com maxixe, de cozinhadinha, de subir nos pés de manga, de coco, de comer frutas do mato, de pescar com minhoca tirada da terra, de lavar roupas com as lavadeiras do Hotel, de arear as panelas com areia e mato, de fazer sabão com soda, de matar galinhas, matar passarinhos com estilingue, redar na beira do córrego, engolir piaba viva pra aprender a nadar, matar e cozinhar cobra, participar dos sambas em mãe Nora, dançar nas festas juninas de Dé Rodrigues, correr atrás do boi de janeiro, ser pastorinha nas folias de Reis, tomar cachaça quente em Guiomar Ferraz, comer as comidas esquisitas de Canjira, atravessar a ponte de bicicletas com as mãos soltas, jogar o material escolar de cima da ponte no quintal de Julao e descer correndo pra buscar com medo dele e planejar durante dias uma descida de bananeira pelo córrego São João.
Foram tantas aventuras que quando paro pra pensar nem eu acredito, por isso escrevo pra não esquecer...
Numa das vezes em que fomos descer nas bananeiras não consegui descer a tempo e como não sabia nadar cheguei ate o rio Jequitinhonha as amigas de aventura gritaram e um canoeiro conseguiu me tirar de lá, mas se por um momento eu tivesse lembrado dos amigos de Valadares, ia dar um safanão no canoeiro, seguir boiando e quem sabe chegar até Miami, nadar eu nunca aprendi, mais coragem eu tinha de sobra!

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